sexta-feira, 18 de abril de 2008

O que ficou em mim

GRUPO DE ESTUDOS DO DIA 11/04/08

Discutimos a cura do real pela ficção, teatroterapia, o modo de tratar questões pessoais pelo teatro e a função do professor, apontada pelo Helio, de trazê-los para a realidade.

Do que a Letícia, a Fabi e o Blas apontaram, entendi que a arte é arte. Se ela é terapêutica, está intrínseco. A arte é política e também sanadora de muitas doenças em um processo só. A terapia é apenas um caminho, sozinha não resolve, precisa de outras ferramentas como o teatro. A arte por si só se resolve. Um exemplo disso é o Bispo do Rosário, que não foi socialmente lúdico mas a arte o libertou e na arte ele pôde existir. Encontrou um caminho para que a loucura fosse uma coisa boa. A arte nesse sentido é libertária, sem exigir padrões, te dá meios para viver.

Quando se tem a possibilidade da via de expressão artística, mesmo que transfigurado, o problema se resolve. Não fosse pela arte, não conheceríamos Van Gogh.

Seja através de qualquer expressão artística, podemos ir adiante da palavra, sem encalhar. Ler uma obra no lugar em que ela retrata, é como ver, sentir e tocar as coisas. A letra pode modificar a vida, como os zeligs, que são a escrita na escrita, uma representação plástica da escrita.

GRUPO DE ESTUDOS DO DIA 18/04/08

Memória: retomamos o que foi discutido semana passada, conversando a respeito de o quanto conseguimos absorver e reter do que foi estudado. Isso também deve ser um exercício praticado sempre, todos os dias.

Discutimos a diferença entre livros para crianças e literatura, que muitas vezes estão em lugares diferentes, como se o que se produz para crianças fosse algo menor, de menos valor literário. Uma das maneiras de se dirigir às crianças é não escrever para crianças. Lembrei do exemplo de Santos Dummond, que quando criança, lia Julio Verne.

Quando o artista produz algo pedagógico não pensando no mercado, tem mais condições de deixar a arte ser predominante e o conteúdo didático subliminar. O didatismo preocupa pela obviedade que pode estar implícita e deixar a obra vazia. E o vazio? Onde está o vazio em mim? Onde me defronto com o vazio e o que ele me representa enquanto pensador de teatro, enquanto artista?

3 comentários:

Fabiana Ferreira disse...

Que vazio é esse? o vazio de cada um!
são tantas, tantas informações em tão pouco espaço de tempo, não cabem em mim. Me sinto atordoada!
Como absorvemos tão pouco de nosso estudo, tudo superficial, trivial e o vazio.

H E L I O D E A Q U I N O disse...

Vazios?!
Somos um corpo carregado de informações que estão em rede como nossas vidas biológicas, não somos de plástico e uma hora as sinapses serão ativadas.
Somos um arquivo vivo. Pra que a pressa de sermos inteligentes, vamos dar tempo para que as conexões sejam feitas.
Na hora da "prova", oral ou escrita, bate a burrice mesmo e geralmente a nota é bem mais baixa do que esperamos. Creio que este tipo de avaliação não seja muito condizente com nossa vivência.
Precisamos experimentar e expressar a informação, mais do que demonstrá-la, menos tecnicismo.
Somos artistas e precisamos de um meio, um veículo, uma ferramenta de expressão.
A mensuração dos nossos estudos está nas "performances", em nossos poucos improvisos nas aulas, nos ensaios...
Precisamos sentir na pele que estamos "preenchendo".

Fabiana Ferreira disse...

É porque tenho a arte pra dar vazão a todo o meu arquivo que sobrevivo. Porém me sinto cheia, e dia a dia, desrespeitosamente, bombardeada. Mas não me refiro apenas a nossa capacidade de armazenar e devolver o conhecimento em forma de discurso falado ou escrito, me refiro aos outros vazios, de misericórdia, de gratidão, de generosidade, tolerância, humildade e tantos outros. Acredito que estamos vivendo a era da superficialidade e da solidão extremas e por mais que eu esteja sendo acolhida pela família abração, que esteja inserida na raiz, na fundação de algo tão importante, procurando, em grupo, refletir sobre o existir através do trabalho no abração, não deixo de perceber e pensar e repensar na “parte que me cabe deste latifúndio”. É neste sentido que aponto esse esvaziamento, tornando o fruto do nosso estudo teórico, pobre de significados realmente capazes de nos levar a fazer novas cognições. O discurso e a prática, o que realmente está entre eles.... Temos ou não consciência desse hiato. O querer e o realmente estar ali, naquele momento, neste caso o do estudo teórico, mas poderia ser qualquer outro momento, como o do improviso artístico. E quando nos dirigimos a ele sem nos dar conta do sagrado privilégio de estar ali, fazendo parte desse jogo mágico, capaz de varrer nossa máquina intelectiva em meia fração de segundos e devolve-lo em forma de poesia... Temos ou não consciência desse hiato? Ou será que nos colocamos de fora de tudo isso, afinal “sabemos” o que queremos e suas implicações... Temos ou não consciência desse hiato? É sobre tudo isso que me questiono e muitas vezes me sinto, de tão cheia, vazia!

O SOBREVIVENTE

por Carolina Mascarenhas


Um pouco de poesia, para o nosso vazio ficar mais cheio de belo.


O SOBREVIVENTE

Impossível compor um poema a essa altura da evolução da humanidade.
Impossível escrever um poema - uma linha que seja - de verdadeira poesia.
O último trovador morreu em 1914.
Tinha um nome de que ninguém se lembra mais.

Há máquinas terrivelmente complicadas para as necessidades mais simples.
Se quer fumar um charuto aperte um botão.
Paletós abotoam-se por eletricidade.
Amor se faz pelo sem-fio.
Não precisa estômago para digestão.

Um sábio declarou a O Jornal que ainda falta
muito para atingirmos um nível razoável de
cultura. Mas até lá, felizmente, estarei morto.

Os homens não melhoram
e matam-se como percevejos.
Os percevejos heróicos renascem.
Inabitável, o mundo é cada vez mais habitado.
E se os olhos reaprendessem a chorar seria um segundo dilúvio.

(Desconfio que escrevi um poema.)

Carlos Drummond de Andrade