quarta-feira, 23 de abril de 2008

ARTE-IDENTIDADE

Um resumo do texto de mesmo nome disponível em Biodanza Brasil e um pouco comentado de acordo com minhas conexões acerca do tema. Minha intenção inicial era postar no blog do Paizinhos, mas creio que pode ser muito interessante aqui também.

Em texto de mesmo nome de Cezar Wagner de Lima Góis, há uma visão sobre a arte pedagógica e terapêutica, com o intuito de entendermos a Arte como importante instrumento para expressão, recriação e fortalecimento da identidade pessoal e coletiva. Neste texto ele coloca que três grandes momentos fizeram a humanidade: a descida das árvores, o uso do fogo e a pintura nas cavernas – a arte.

“A imaginação surge com o gesto tosco de riscar e este riscar vira pintura, que recria a imaginação que transborda como arte, como expressão do si-mesmo (identidade pessoal)* em sua forma primitiva nascente e vinculada ao mundo circundante. (identidade coletiva)*

*Comentários pessoais.

IDENTIDADE

Ao falar de identidade o autor discorre sobre definições de Aristóteles a Rolando Toro (da Biodanza) e aponta coisas que já discutimos de culturação e aculturação (lembram?), e de que de todas as sementes da Vida somos apenas mais uma, nem mais nem menos importantes. Isto nos remete a irmandade de tudo que tem vida sobre a Terra e no Universo, e segundo o príncípio biocêntrico, devemos sempre nos colocar no “ponto de vista” de todos os seres, é o Perspectivismo que já foi apontado em uma de nossas reuniões. Destaco aqui um trecho que julgo um dos mais importantes para falar de identidade e autonomia, diversidade e tolerância.

“Nesse sentido a identidade evolui como identidade-amor, ou seja, o amor como expressão de uma corporeidade vivida (identidade presentificada), conectiva, em uma relação de totalidade com outra identidade, uma pessoa inteira com outra pessoa inteira. (Simmel, 1993).”

Vale a pena repensar até nossas relações pessoais mais próximas, ninguém é metade de ninguém, por mais simbiótica que seja a relação.

“As vivências biocêntricas geram o Ser-Amor. Enquanto o Ser-Objeto se encontra no ser que experimenta as coisas (Eu-Isso), o Ser-Amor é o ser que vivencia a vida (Eu-Tu), só possível em uma relação de totalidade e não em uma relação com objetos. A vivência da vida é uma relação de encontro - de Amor.”

ARTE

Não se separa arte de identidade, uma favorece a outra. C.W Lima Góis afirma a Arte como fundamental e indispensável para expressão do Si-mesmo à mente Humana. Em suas palavras:

“Criar é viver. Quem vive, cria. Criar é instalar o novo, sabendo que nesse instante se tornou velho. Criar é pegar o velho e explicá-lo de novas maneiras. Criar é transcender o novo e o velho. Criar é ir fundo dentro de si mesmo, aceitar-se como criatura e movimentar-se como criador.”

O que ele relata em seguida é sua experiência no campo da arte terapia, que conversamos um pouco sobre na ocasião do capítulo “Da cura do real pela ficção” de Romanno, onde apontamos a nossa experiência com o Núcleo de Teatro Amador da Cia do Abração e que muito se assemelham as experiências relatadas por ele. As diferenças criativas se diluem na criação coletiva, o que acontece é uma licença indiferente à razão.

“Nesse processo de indiferenciação cada um se perde no outro e no material de trabalho, vivendo um consentimento mútuo, ou melhor, uma cumplicidade universal que não pertence a eles próprios.”

Isso destaca o que já havíamos comentado, que a arte “dá conta” por si de atingir objetivos terapêuticos, no entanto para tratá-los surge a necessidade de atenção técnica especializada, como psicólogos ou psicodramatistas.

Gostaria de não precisar de tantas citações e ter mais autonomia, mas diante de um discurso tão próximo ao nosso fica difícil não parecer pura redundância e o texto já é muito objetivo ao que se propõe. Então, sem vergonha, encerro com mais um trecho que reforça a questão da Arte-identidade:

“A vida nesse instante emerge autônoma, espontânea, já que as pessoas não se intitulam como referenciais máximos ou mesmo como proprietárias da vida. Cada pessoa emerge como força instintiva, criadora do mundo e de si mesmas. Estão entregues à totalidade, estão em profunda comunhão – cada pessoa é a própria arte. Está em profunda comunicação consigo mesma, com os outros e com o Universo. Acontece uma infiltração, uma identificação. Cada qual se deixa entrar no outro, saindo inteiro em sua singularidade (Cezar Wagner, Ana Luísa Menezes e Altamir Aguiar, 1993, 2005).”

O texto original ainda apresenta parágrafos falando das linguagens artísticas, passando pelo drama e pelo teatro de rua que valem a pena serem lidos. A conclusão é muito esclarecedora para quem passa pelo texto e se sente meio “boiando”. O melhor são as conexões com outros assuntos que vimos discutindo.

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O SOBREVIVENTE

por Carolina Mascarenhas


Um pouco de poesia, para o nosso vazio ficar mais cheio de belo.


O SOBREVIVENTE

Impossível compor um poema a essa altura da evolução da humanidade.
Impossível escrever um poema - uma linha que seja - de verdadeira poesia.
O último trovador morreu em 1914.
Tinha um nome de que ninguém se lembra mais.

Há máquinas terrivelmente complicadas para as necessidades mais simples.
Se quer fumar um charuto aperte um botão.
Paletós abotoam-se por eletricidade.
Amor se faz pelo sem-fio.
Não precisa estômago para digestão.

Um sábio declarou a O Jornal que ainda falta
muito para atingirmos um nível razoável de
cultura. Mas até lá, felizmente, estarei morto.

Os homens não melhoram
e matam-se como percevejos.
Os percevejos heróicos renascem.
Inabitável, o mundo é cada vez mais habitado.
E se os olhos reaprendessem a chorar seria um segundo dilúvio.

(Desconfio que escrevi um poema.)

Carlos Drummond de Andrade