“No começo foi difícil, depois foi ficando mais difícil e agora a dificuldade está maior ainda.”
Uma corda-idéia lançada pelo Blas (estrangeiro e que queria falar sobre o ser estrangeiro). Tinhamos uma vaga idéia do que podia ser, sabendo de sua situação no Brasil e não só a dele, mas de muitas pessoas, por histórias que ouvimos, vemos ou presenciamos diariamente, seja na mídia ou do nosso lado. Também tinhamos pessoas dispostas a encarar o desafio. Lembro que nas primeiras conversas até a “física quântica” estava presente e acabamos no “teatro físico”. Após longos grupos de estudo, onde lemos “A cegueira e o saber” do Affonso Romano de Sant’ana, “A verdade e as formas jurídicas” do Michael Foucalt, textos que o Francisco Gaspar nos trouxe, materiais que geraram muitas discuções (boas) e (boas) conversas. Tinhamos várias cordas para segurar, mas ainda muito frágeis, eram muitas as possibilidades de estrangeiros e de assuntos a serem abordados. Aos poucos foi-se afunilando o tema e caímos na nossa realidade, onde ficou forte a necessidade de nos comunicarmos com nossos vizinhos, separados por um muro e muitas vezes estrangeiros. Instigados pela nova proposta, Blas e eu iniciamos entrevistas com os vizinhos. A primeira foi com a Neusa, uma senhora que nos recebeu muito bem e nos contou um pouco de sua vida e o que ela pensa da vida hoje, em contraponto com a vivida em um passado distante, onde as pessoas se conheciam, se preocupavam umas com as outras. Questões muito fortes constatadas nessa entrevista foram, a solidão e a necessidade de se expressar. Esse foi o momento em que eu me vi com uma grande responsabilidade nas mãos, e percebi o quanto somos estrangeiros uns para os outros, o quanto não nos conhecemos e não queremos ou precisamos nos conhecer, em um mundo fast-food, onde tudo é muito rápido e individualista. As relações e as demonstrações de afeto são rápidas e cada vez mais raras.
Conversas que se seguiram e inclusive anteriormente, na leitura do livro “A Cegueira e o Saber”, nos levou a discutir sobre a contemporaneidade e o que se produz hoje artisticamente, e percebemos que sim, a arte contemporânea é um reflexo muito forte dessas relações, desse mundo acelerado em que vivemos. Parece que cada um fala em uma língua diferente e a comunicação é quase impossível quissá a afetação!
Outras entevistas se seguiram e foi muito fácil identificar características semelhantes. Desse material, surgiram textos, inspiração para cenas e mais que isso, consciência do que estamos fazendo e refletindo, do que queremos refletir para os nossos semelhantes, o que queremos ser na vida uns dos outros. Uma constatação eu tive, não quero ser um estrangeiro na vida, isso me fez pensar em minha identidade, minhas necessidades e dificuldades para não o ser. Ao mesmo tempo acaba sendo um fato, não só na minha, mas na vida de cada ser humano, que até em suas relações mais banais, cotidianas, passam por estrangeiros.
Como em todos os processos, acabamos nos plugando nesse assunto e o levando pra todos os lugares, daí surgem as situações estrangeiras, muitas vezes cômicas, mas que refletem muito bem o nosso tempo. Elas vão desde uma conversa na fila do banco, experiência vivida pela Letícia, ou no mercadinho, onde eu mantive duas conversas paralelas sobre o mesmo assunto, porém as pessoas que conversavam comigo, falavam de assuntos diferentes.
Outra experiência muito significante foi o intercâmbio cultural com o Diretor teatral paraguaio Wal Mayans, quando esteve no Brasil com seu grupo, todos falando em outra língua e nós, tendo que nos comunicar, nos entender. É claro que com um pouco de sensibilidade e cara-de-pau, isso não foi tarefa difícil. Com o Wal presente de forma mais ativa no processo, começamos os trainigs diários, onde fazíamos corridas diárias e passavamos por um processo de elaboração de sequências individuais de treinamento, visando uma autonomia na preparação dos corpos dos atores, a longo prazo, essa prática foi tomando uma forma mais consistente e consciente, sendo uma prática diária dentro da Cia. do Abração, abrangendo o pensamento de grupo em aspectos filosóficos e práticos, sendo chamado então de training pessoal.
O Wal nos apresentou uma nova forma de criação, individual e coletiva, com um treinamento pesado e muito eficiente, em pouco tempo os corpos estavam diferentes, mais prontos, mais resistentes para o tipo de trabalho que nos propusemos a fazer. Toda a primeira parte do treinamento foi no solo, a criação de células coreográficas, individuais e coletivas e os tainigs pessoais. A criação era no escuro, por assim dizer, criávamos sem saber a finalidade exata da criação, assim foi durante um bom tempo, onde levantamos muito material corporal até aos poucos irem se encaixando em uma dramaturgia coerente com todo o processo de estudo e material intelectual e pessoal estudado anteriormente. Essa etapa final foi onde a definição de dramaturgia tomou corpo, sempre vista com o olhar cuidadoso da Letícia e o olhar preciso do Wal.
Em uma das últimas vindas do Wal começamos o processo de elevação da dramaturgia, onde as cordas passaram a estar mais presentes nas coreografias compostas com o Wal. Não foi mais difícil que dar o primeiro passo na corda. Recordo as primeiras tentativas de andar na corda bamba, sim porque começamos com uma corda mesmo e não um slack. Ficar parado, ter consciência de todas as partes do corpo para manter-se em equilibrio, saber quais são os limites, foi um verdadeiro teste emocional, de resistência e de persistência até dar os primeiros passos, os primeiros textos aéreos. Uma parte empolgante que destaco desta etapa do processo, foram os dias em que ficavamos, sem formalidade, treinando na corda e conseguiamos resultados ótimos e divertidos, todos se ajudavam e assim, caminhos mais longos eram percorridos e descobríamos formas de ficar mais tempo em cima da corda e brincando ganhávamos resistência e condicionamento físico.
O treinamento na corda ficou a cargo do nosso instrutor Juca, que nos acompanhou com oficinas de técnica e também criação de material coreográfico aéreo. Tanto no Abração, como na Campo Base, escola de montanhismo onde o Juca nos levou algumas vezes para treinar.
O treinamento do projeto A-CORDA foi feito com muito trabalho, força e resistência, não só resistência física, mas também ideológica, enquanto indivíduos de um grupo, desenvolvendo um pensamento coletivo. Tivemos tanto que privar por um individual, exercitar autonomia, que o coletivo se destaca de uma maneira muito sólida. Durante esse processo em vários momentos quis desistir, fiquei enjoado por conta dos exercícios passador pelo Wal, mas ao mesmo tempo sabia que tudo aquilo era necessário, mesmo não chegando a 1% do que ele passou para ser o que é hoje. Entretando, tivemos bons resultados em pouco tempo de trabalho, acredito que pela boa fundamentação física e teórica que já vinhamos desenvolvendo na Cia. do Abração, uns há mais, outros há menos tempo e eu há quase três anos e ansioso pelos próximos 20.
Destaco também o trabalho da Campelli e do Alysson, com toda a assessoria no que diz respeito a dramaturgia sonora do espetáculo, desde o cuidado na confecção dos instrumentos de corda até as tentativas de entendimento teórico de música por parte dele e da Campelli, que com sua miríade de conhecimentos nos inspira e coordena de forma bastante eficiente a distribuição de sonoridades pelo espaço. Nesse tocante a Letícia tem um papel muito importante vendo as nuances dos sons, seja das músicas ou os textos e vendo, ou melhor, ouvindo tudo como uma grande música, e assim orquestrando as cenas.
A experiência visual que vem sendo testada traz matizes de terracota, nas texturas das cordas, das paredes, inclusive dos figurinos. Meu desejo ainda é ter terra no cenário de maneira mais ampla, forrando o chão e ver qual o drama que esse elemento traz. Aos poucos ela foi sendo inserida, em uma cena e outra causando um efeito belíssimo e significativo. Por conta do trabalho coreográfico das cenas, esse trabalho traz muitas imagens, como quadros que se montam e desmontam, com a chegada da iluminação na pesquisa, pudemos evidenciar os corpos, as cordas e os elementos cenográficos em molduras, como um ballet de imagens, cores e texturas. O Anry Aider, trouxe uma proposta de iluminação que ainda está amadurecendo, assim como tudo, mas já aponta um caminho. Acredito que ainda muitas tentativas serão realizados, afim de estabelecer um conflito maior entre a iluminação e toda a composição dramaturgica. Recordo que na composição das personagens, com adereços e figurinos, pensávamos em elementos que nos deixasse estrangeiros, que nos causasse esse sensação, então se algo nos encomodasse, aí sim poderia ser útil para a pesquisa.
Uma grata participação aconteceu na reta final da primeira etapa do Projeto A-CORDA, o diretor teatral iataliano, Roberto Inocenti, após tomar conhecimento do projeto e assistir um dos ensaios abertos, nos presenteou com poemas escritos em sua “experiência” como estrangeiro no Brasil. Inspirado nesses poemas escrevi um dos textos presentes na dramaturgia da pesquisa:
“Avistou o cinza, apenas o cinza do vaso vazio, da tarde, da cidade, da gente que ele não era. Passado e futuro o confundem e o tempo não passa. O tempo não passa, pássaro sem asas veio ver a flor cinza, cintilante, ante mim, de antemão a empurrei. 31 segundos ele levou até o chão. Já se camuflou de cinza.
Assim como a maioria dos textos, esse entrou em uma cena já pronta. A partir da minha proposta ele se encaixou na cena de acordo com a partituração e o olhar da Letícia. Acabou dando o tom e de certa forma ilustrando as ações que eram executadas pelos atores.
Mesmo sabendo que ainda é uma obra aberta, sinto-me bastante realizado com essa etapa do processo, foi uma forma de trabalho muito coerente onde encontramos um casamento perfeito com tudo que já vinha sendo desenvolvido na Cia. do Abração. Agregando as técnicas trazidas, nos encontramos pensando mais, trabalhando mais e exercitando mais os corpos e inclusive o pensamento do grupo como um ser complexo, um organismo vivo, que respira e precisa ser alimentado diariamente, assim como a fé de seus integrantes, trabalhamos com arte, pela arte e dela tiramos o nosso sustento, a nossa crença, a nossa vida, mais uma vez vejo como reflexo de uma escolha de vida para a vida, minha e das pessoas com quem resolvi compartilhar esse sonho, incluindo assim cada ser humano, estrangeiro, ou não, que passou por esse processo, colaborando ou simplesmente doando seu olhar sensível como espectador, sem ser simplismente passivo, diante do tema proposto, mas compartilhando sentimentos ou nos abraçando silenciosamente, deixando falar o coração, uma língua universal, que entendemos muito bem.
Termino esse olhar, não com um ponto final mas com um poema da Helena Kolody, que para mim representa muito do que foi e do que ainda será A-CORDA:
Convite
Completou-se uma jornada
Uma corda-idéia lançada pelo Blas (estrangeiro e que queria falar sobre o ser estrangeiro). Tinhamos uma vaga idéia do que podia ser, sabendo de sua situação no Brasil e não só a dele, mas de muitas pessoas, por histórias que ouvimos, vemos ou presenciamos diariamente, seja na mídia ou do nosso lado. Também tinhamos pessoas dispostas a encarar o desafio. Lembro que nas primeiras conversas até a “física quântica” estava presente e acabamos no “teatro físico”. Após longos grupos de estudo, onde lemos “A cegueira e o saber” do Affonso Romano de Sant’ana, “A verdade e as formas jurídicas” do Michael Foucalt, textos que o Francisco Gaspar nos trouxe, materiais que geraram muitas discuções (boas) e (boas) conversas. Tinhamos várias cordas para segurar, mas ainda muito frágeis, eram muitas as possibilidades de estrangeiros e de assuntos a serem abordados. Aos poucos foi-se afunilando o tema e caímos na nossa realidade, onde ficou forte a necessidade de nos comunicarmos com nossos vizinhos, separados por um muro e muitas vezes estrangeiros. Instigados pela nova proposta, Blas e eu iniciamos entrevistas com os vizinhos. A primeira foi com a Neusa, uma senhora que nos recebeu muito bem e nos contou um pouco de sua vida e o que ela pensa da vida hoje, em contraponto com a vivida em um passado distante, onde as pessoas se conheciam, se preocupavam umas com as outras. Questões muito fortes constatadas nessa entrevista foram, a solidão e a necessidade de se expressar. Esse foi o momento em que eu me vi com uma grande responsabilidade nas mãos, e percebi o quanto somos estrangeiros uns para os outros, o quanto não nos conhecemos e não queremos ou precisamos nos conhecer, em um mundo fast-food, onde tudo é muito rápido e individualista. As relações e as demonstrações de afeto são rápidas e cada vez mais raras.
Conversas que se seguiram e inclusive anteriormente, na leitura do livro “A Cegueira e o Saber”, nos levou a discutir sobre a contemporaneidade e o que se produz hoje artisticamente, e percebemos que sim, a arte contemporânea é um reflexo muito forte dessas relações, desse mundo acelerado em que vivemos. Parece que cada um fala em uma língua diferente e a comunicação é quase impossível quissá a afetação!
Outras entevistas se seguiram e foi muito fácil identificar características semelhantes. Desse material, surgiram textos, inspiração para cenas e mais que isso, consciência do que estamos fazendo e refletindo, do que queremos refletir para os nossos semelhantes, o que queremos ser na vida uns dos outros. Uma constatação eu tive, não quero ser um estrangeiro na vida, isso me fez pensar em minha identidade, minhas necessidades e dificuldades para não o ser. Ao mesmo tempo acaba sendo um fato, não só na minha, mas na vida de cada ser humano, que até em suas relações mais banais, cotidianas, passam por estrangeiros.
Como em todos os processos, acabamos nos plugando nesse assunto e o levando pra todos os lugares, daí surgem as situações estrangeiras, muitas vezes cômicas, mas que refletem muito bem o nosso tempo. Elas vão desde uma conversa na fila do banco, experiência vivida pela Letícia, ou no mercadinho, onde eu mantive duas conversas paralelas sobre o mesmo assunto, porém as pessoas que conversavam comigo, falavam de assuntos diferentes.
Outra experiência muito significante foi o intercâmbio cultural com o Diretor teatral paraguaio Wal Mayans, quando esteve no Brasil com seu grupo, todos falando em outra língua e nós, tendo que nos comunicar, nos entender. É claro que com um pouco de sensibilidade e cara-de-pau, isso não foi tarefa difícil. Com o Wal presente de forma mais ativa no processo, começamos os trainigs diários, onde fazíamos corridas diárias e passavamos por um processo de elaboração de sequências individuais de treinamento, visando uma autonomia na preparação dos corpos dos atores, a longo prazo, essa prática foi tomando uma forma mais consistente e consciente, sendo uma prática diária dentro da Cia. do Abração, abrangendo o pensamento de grupo em aspectos filosóficos e práticos, sendo chamado então de training pessoal.
O Wal nos apresentou uma nova forma de criação, individual e coletiva, com um treinamento pesado e muito eficiente, em pouco tempo os corpos estavam diferentes, mais prontos, mais resistentes para o tipo de trabalho que nos propusemos a fazer. Toda a primeira parte do treinamento foi no solo, a criação de células coreográficas, individuais e coletivas e os tainigs pessoais. A criação era no escuro, por assim dizer, criávamos sem saber a finalidade exata da criação, assim foi durante um bom tempo, onde levantamos muito material corporal até aos poucos irem se encaixando em uma dramaturgia coerente com todo o processo de estudo e material intelectual e pessoal estudado anteriormente. Essa etapa final foi onde a definição de dramaturgia tomou corpo, sempre vista com o olhar cuidadoso da Letícia e o olhar preciso do Wal.
Em uma das últimas vindas do Wal começamos o processo de elevação da dramaturgia, onde as cordas passaram a estar mais presentes nas coreografias compostas com o Wal. Não foi mais difícil que dar o primeiro passo na corda. Recordo as primeiras tentativas de andar na corda bamba, sim porque começamos com uma corda mesmo e não um slack. Ficar parado, ter consciência de todas as partes do corpo para manter-se em equilibrio, saber quais são os limites, foi um verdadeiro teste emocional, de resistência e de persistência até dar os primeiros passos, os primeiros textos aéreos. Uma parte empolgante que destaco desta etapa do processo, foram os dias em que ficavamos, sem formalidade, treinando na corda e conseguiamos resultados ótimos e divertidos, todos se ajudavam e assim, caminhos mais longos eram percorridos e descobríamos formas de ficar mais tempo em cima da corda e brincando ganhávamos resistência e condicionamento físico.
O treinamento na corda ficou a cargo do nosso instrutor Juca, que nos acompanhou com oficinas de técnica e também criação de material coreográfico aéreo. Tanto no Abração, como na Campo Base, escola de montanhismo onde o Juca nos levou algumas vezes para treinar.
O treinamento do projeto A-CORDA foi feito com muito trabalho, força e resistência, não só resistência física, mas também ideológica, enquanto indivíduos de um grupo, desenvolvendo um pensamento coletivo. Tivemos tanto que privar por um individual, exercitar autonomia, que o coletivo se destaca de uma maneira muito sólida. Durante esse processo em vários momentos quis desistir, fiquei enjoado por conta dos exercícios passador pelo Wal, mas ao mesmo tempo sabia que tudo aquilo era necessário, mesmo não chegando a 1% do que ele passou para ser o que é hoje. Entretando, tivemos bons resultados em pouco tempo de trabalho, acredito que pela boa fundamentação física e teórica que já vinhamos desenvolvendo na Cia. do Abração, uns há mais, outros há menos tempo e eu há quase três anos e ansioso pelos próximos 20.
Destaco também o trabalho da Campelli e do Alysson, com toda a assessoria no que diz respeito a dramaturgia sonora do espetáculo, desde o cuidado na confecção dos instrumentos de corda até as tentativas de entendimento teórico de música por parte dele e da Campelli, que com sua miríade de conhecimentos nos inspira e coordena de forma bastante eficiente a distribuição de sonoridades pelo espaço. Nesse tocante a Letícia tem um papel muito importante vendo as nuances dos sons, seja das músicas ou os textos e vendo, ou melhor, ouvindo tudo como uma grande música, e assim orquestrando as cenas.
A experiência visual que vem sendo testada traz matizes de terracota, nas texturas das cordas, das paredes, inclusive dos figurinos. Meu desejo ainda é ter terra no cenário de maneira mais ampla, forrando o chão e ver qual o drama que esse elemento traz. Aos poucos ela foi sendo inserida, em uma cena e outra causando um efeito belíssimo e significativo. Por conta do trabalho coreográfico das cenas, esse trabalho traz muitas imagens, como quadros que se montam e desmontam, com a chegada da iluminação na pesquisa, pudemos evidenciar os corpos, as cordas e os elementos cenográficos em molduras, como um ballet de imagens, cores e texturas. O Anry Aider, trouxe uma proposta de iluminação que ainda está amadurecendo, assim como tudo, mas já aponta um caminho. Acredito que ainda muitas tentativas serão realizados, afim de estabelecer um conflito maior entre a iluminação e toda a composição dramaturgica. Recordo que na composição das personagens, com adereços e figurinos, pensávamos em elementos que nos deixasse estrangeiros, que nos causasse esse sensação, então se algo nos encomodasse, aí sim poderia ser útil para a pesquisa.
Uma grata participação aconteceu na reta final da primeira etapa do Projeto A-CORDA, o diretor teatral iataliano, Roberto Inocenti, após tomar conhecimento do projeto e assistir um dos ensaios abertos, nos presenteou com poemas escritos em sua “experiência” como estrangeiro no Brasil. Inspirado nesses poemas escrevi um dos textos presentes na dramaturgia da pesquisa:
“Avistou o cinza, apenas o cinza do vaso vazio, da tarde, da cidade, da gente que ele não era. Passado e futuro o confundem e o tempo não passa. O tempo não passa, pássaro sem asas veio ver a flor cinza, cintilante, ante mim, de antemão a empurrei. 31 segundos ele levou até o chão. Já se camuflou de cinza.
Assim como a maioria dos textos, esse entrou em uma cena já pronta. A partir da minha proposta ele se encaixou na cena de acordo com a partituração e o olhar da Letícia. Acabou dando o tom e de certa forma ilustrando as ações que eram executadas pelos atores.
Mesmo sabendo que ainda é uma obra aberta, sinto-me bastante realizado com essa etapa do processo, foi uma forma de trabalho muito coerente onde encontramos um casamento perfeito com tudo que já vinha sendo desenvolvido na Cia. do Abração. Agregando as técnicas trazidas, nos encontramos pensando mais, trabalhando mais e exercitando mais os corpos e inclusive o pensamento do grupo como um ser complexo, um organismo vivo, que respira e precisa ser alimentado diariamente, assim como a fé de seus integrantes, trabalhamos com arte, pela arte e dela tiramos o nosso sustento, a nossa crença, a nossa vida, mais uma vez vejo como reflexo de uma escolha de vida para a vida, minha e das pessoas com quem resolvi compartilhar esse sonho, incluindo assim cada ser humano, estrangeiro, ou não, que passou por esse processo, colaborando ou simplesmente doando seu olhar sensível como espectador, sem ser simplismente passivo, diante do tema proposto, mas compartilhando sentimentos ou nos abraçando silenciosamente, deixando falar o coração, uma língua universal, que entendemos muito bem.
Termino esse olhar, não com um ponto final mas com um poema da Helena Kolody, que para mim representa muito do que foi e do que ainda será A-CORDA:
Convite
Completou-se uma jornada
De um ponto final
Na euforia da chegada
Há um convite irrecusável
Para uma nova partida
Nenhum comentário:
Postar um comentário