quinta-feira, 16 de abril de 2009

SEM CHÃO


Pés em chão de nuvens.

Mãos segurando cordas sem fim atadas ao céu.

E se me atirasse agora na terra? Será que ainda conseguiria tocar o chão?

Caminho sem chão?

E continuo olhando o horizonte, e continuo subindo nessa corda...

E quando chegar às estrelas aonde ela esta amarrada, vou, enfim, chegar ao meu país.

Mas, enquanto essa corda for infinita...

Não sou a chegada.

Não sou o regresso.

Ainda sou o caminho.

E no meio do caminho tinha uma pedra?
No meio do caminho dos poetas, dos equilibristas, dos loucos e das crianças...

Têm estrelas.

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O SOBREVIVENTE

por Carolina Mascarenhas


Um pouco de poesia, para o nosso vazio ficar mais cheio de belo.


O SOBREVIVENTE

Impossível compor um poema a essa altura da evolução da humanidade.
Impossível escrever um poema - uma linha que seja - de verdadeira poesia.
O último trovador morreu em 1914.
Tinha um nome de que ninguém se lembra mais.

Há máquinas terrivelmente complicadas para as necessidades mais simples.
Se quer fumar um charuto aperte um botão.
Paletós abotoam-se por eletricidade.
Amor se faz pelo sem-fio.
Não precisa estômago para digestão.

Um sábio declarou a O Jornal que ainda falta
muito para atingirmos um nível razoável de
cultura. Mas até lá, felizmente, estarei morto.

Os homens não melhoram
e matam-se como percevejos.
Os percevejos heróicos renascem.
Inabitável, o mundo é cada vez mais habitado.
E se os olhos reaprendessem a chorar seria um segundo dilúvio.

(Desconfio que escrevi um poema.)

Carlos Drummond de Andrade